Escola Superior de Ifá (Èsì)
Curso de Filosofia e Teologia Yorùbá
Módulo Òrìṣà Sango
"Através dos seguintes módulos sobre Òrìṣà, os alunos da ÈSÌ poderão ter um enfoque claro e específico sobre alguns dos Òrìṣà mais conhecidos na América. O seguinte material não tem o objetivo de treinar pessoas, e não procura ter a verdade absoluta. É hora de os seguidores de Òrìṣà evoluírem, indo para uma perspectiva verdadeiramente tradicional, entendendo que pertencemos a uma tradição plural, e baseada na oralidade. Portanto, nada pode ser verdade totalitária, mais nada tem que deixar de ser verdade.
Akogun Ifáṣọlá Ajobi Àgboọlà
SANGO
Para começar
falando sobre Sango, primeiramente é preciso compreender o entendimento
conceitual sobre a divindade dos Yorubas. Sango, como outros Orisas, possui uma
visão dupla que o conforma como tal, falando de forma mais compreensível para o
público leigo, existem dois Sangos, que no processo de divinização formam uma
mesma divindade. Nessa introdução tentarei fazer uma abordagem desses dois
aspectos para uma melhor qualidade da informação desenvolvida no presente
material.
Sango Ayilegbee Orun
Este é o
Irunmole Sango, o nome Ayilegbee Orun segundo me foi passado poderia ser
traduzido como “Aquele que derruba as muralhas do Orun”. Esse nome espiritual
do Irunmole descreve de forma poética a força e poder do raio e dos trovões.
Este Imole também é conhecido como Jakuta “Aquele que briga com pedras”, nome
que é retratado no Odu Oturupon Otua, quando aparece a repartição da semana
tradicional.
A história
conta que o primeiro dia foi Obatala quem ficou para ele, o segundo dia ele deu
para Orunmila e seus seguidores, o terceiro dia foi dado para Ogun, mais o
quarto eles não decidiam a quem seria dado. Sango Ayilegbee Orun ficou muito
aborrecido por os outros Irunmole não o levarem em conta. Com muita raiva ele
fez chover pedras para mostrar seu poder. Foi ali que os Irunmole deram para
ele o quarto dia, e botaram o nome de Ojo Jakuta “O dia que brigou com pedras”,
desde aquele dia Sango é venerado no quarto dia da semana Yoruba.
Sobre isso Ifá
diz:
Alakoneri awo Alara
Eniyan kose wonranwonran
Kio toro ese enikeji re se wonranwonran
A dia fun Orunmila
Nlo toro Ojo lowo Olodumare
Ki apa oun baa leka ojo
Orunmila o si gbebo rubo
Olodumare ni:
Oun ko ma niile fi ojo fun un
Sugbon oun yoo jeki o maa mo Oruko
Gbogbo awon ojo ati awon ohun
Ti o dará lati maase ninu won l´aye
Tradução:
Um sonho não tem testemunha
Se uma pessoa não tem descanso
Roga a outra pessoa que seus pés se movimentam sem descanso
Consultaram Ifá para Orunmila
Quando Baba iria pedir um dia a Olodumare
Para poder ter o governo sobre o sol
Foi aconselhado a fazer ebo
Ele ouviu e o fiz
Então Olodumare diz:
Você Orunmila: não posso lhe dar o poder sobre o sol, mas eu lhe mostrarei o segredo dos nomes e como usar cada dia da semana.
Por essa razão
é que a representação deste Irunmole é o Edun Ara (Pedra de raio), suas
histórias estão envoltas no misticismo sobre elas, o fato de ter a crença que
elas caíram do céu, as torna sagradas e infalível no culto a Sango. Outro
instrumento importante é o Seere, que seria uma espécie de cabaça preparada de
forma especifica por sacerdotes deste Orisa. Ao contrário do que se acredita
por muitos na América, Seere é uma esposa mística de Sango, portanto é um
instrumento de sexo feminino. A história conta que Sango só poderia ter filhos
com Seere no Orun, e ela o acompanhou até o Aye, por isso ele e ela até os dias
de hoje são inseparáveis.
Ifá fala no odu
Ika meji assim:
Iwo lo rele Ika
Iwo lo todo ika bo
A dia fun Seere
Eleyi ti nse obirin Sango
Igba ti f´omi oju sugbere t´omo
Ebo ni won ni ko waa se
O si gbebo mbe o ru bo
Ero ipo
Ero ofa
Seere fidi bale
Omo ni o n ko jo
Tradução:
Iwo foi até a casa de Ika
E foi o que voltou para a casa de Ika
Elos consultaram para Seere
Que era a esposa de Sango
Quando ela se lamentava por não ter filhos
Elos aconselharam a fazer Ebo
Ela ouviu e o fiz
Peregrinos de Ipo
Peregrinos de Ofa
Seere toca o chão com seu fundo
Ela agora tem filhos em grande quantidade
Por essa razão
Sango é chamado sempre com o Seere por seus filhos, ele tem um som
caraterístico para ser tocado. O certo é que o culto de Sango tem muita
associação com o som, isso pode ser apreciado em seu Oriki que diz: Oluibon
Orun “O dono da espingarda do Orun”.
Em continuação
veremos outro instrumento importante em seu culto, o famoso tambor Bata.
Durante muito tempo, essa relação foi mal entendida por praticantes desta parte
do mundo, muitas pessoas atribuíram os tambores a Sango, mas isso não é bem
assim. O certo é que Sango tem afinidade com um tambor particular, mais todos
os tambores pertencem ao Orisa Ayan Agalu. Porém, isso é material para outro
módulo no futuro.
A história diz
que Sango se simpatizou com o som do Bata por seu caráter festivo, eles eram muitos
amigos no Orun. Mas Bata um dia queria tomar uma mulher que Sango tinha como
esposa, chamada Roro (Sonido do trovão), ele foi a consultar Ifá e os Babalawo
viram Ese kan Ola, eles falaram que para não perder sua vida deveria fazer ebo,
ele assim fez. Sango por outro lado, apesar de se sentir traído, perdoou sua
vida, no entanto ele castigou Bata convertendo-lhe em um escravo que sempre o
serviria.
Ifá fala assim
no Odu Ese kan Ola:
Ese kan ki
Ese kan mo
A dia fun Bata
Eyin ti n lo ree gba Roro obirin Sango
Ebo ni won ni ko se
O si gbebo nbe o rubo
Nje Bata a ni mofe Roro na
Ese kan ki
Ese kan mo
Tradução:
Ese kan ki
Ese kan mo
Consultaram Ifá para Bata
Quando ele iria roubar a Roro a esposa de Sango
Eles orientaram a fazer Ebo
Ele ouviu e o fez
E por isso que agora Bata ostenta a Roro
Ese kan ki
Ese kan mo
Sango Olufiran
Como foi
explicado no começo, Sango sendo o Irunmole dos raios e trovões, veio para o
Aye como humano. Ele teria vários nomes segundo diferentes fontes, um seria
Olufiran, outro Tela Oko, e outro Arabambi. Ele seria filho de Oranmiyan e
Torosi uma princesa de origem Nupe, filha do rei Elempe. Segundo seus seguidores, ele teria sido o 3º
Alaafin (Rei de Oyo). A história diz que quando seu pai Oranmiyan o fundador de
Oyo deixo o poder em mãos de seu filho mais velho Ajuwon Ajaka, esse não teve
um bom reinado ocasionando uma divisão interna entre os Oyo Mesi (o estado de
governo). O exército da cidade de Owu começo a querer tomar o poder.
Um certo dia os
soldados de Owu capturaram a Ajaka, e logo existiu uma disputa pelo poder do
reino. Para evitar um estado de anarquia, os Oyo mesi foram em busca de
Olufiran para ajudar a restabelecer a ordem.
Sango Olufiran
ficou a par da situação e dirigiu a expedição de resgate de seu irmão. Quando
Ajaka voltou, os próprios Oyo mesi não permitiram que tomasse o poder e
colocaram a Olufiran em seu lugar.
Isso aconteceu
por demostrar um caráter diferente de seu irmão que era considerado débil, e em
ocasiões impossibilitado de tomar decisões. Ao contrário, Sango Olufiran
fortaleceu o exército, e expulsou os Owu de Oyo. Com o tempo Sango se tornou
temido até por seus próprios generais. Ele se apoio muito na parte espiritual
para conquistar seu poder, consultando um Babalawo chamado Orere. Esse foi quem
constatou que Sango Olufiran era incorporado pelo espírito do raio, quando ele
usava preparações magicas feitas com Edun Ara. De ali em diante ele foi
conhecido como Arira, porque ele controlava os fenômenos naturais relacionados
com raios. Em razão disso Sango Olufiran tornou se chefe do culto ao Irunmole
Sango Ayilegbee Orun, e os seguidores do culto acreditavam que Sango Olufiran
era o próprio deus encarnado, ele compartilhava tudo o que se sabia dos mitos
sobre a divindade, líder, guerreiro, dançarino , controlava a chuva, os raios e
trovões.
Sango teve
várias esposas, a primeira foi Oba asabo eleko, outra foi Osun, mas ele também
se casou com Oya, ela certamente era diferente das demais. Ele ficou apaixonado
com o caráter forte dela, um dia ela descobriu o segredo dos Edun Ara dele, ele
a confrontou e ela não sentiu medo algum para com ele, ao contrário ela tentou
brigar, Sango ficou surpreso e decidiu que ela seria a mulher que ele queria
para sua vida, elos são inseparáveis desde então.
Ifá fala no Odu
Irosun Osa assim:
Arosun sa o n ro
Arosun as o n ro
Ewiri ni n boke odo tenu wiyewiye pe na jo
A dia fun Sango
Ti n lo ree soko Oya
Ebo ni won ni kose
O si gbebo nbe o rubo
Nje Sango de o
Oko Oya
Agbena genge ateke lenu ya
Tradução:
Arosun sa o n ro
Arosun sa o n ro
Es Ewiri que está no rio e ele passa a mão por sua boca cuidadosamente
Se consulto Ifa para Sango
Quando ele seria o esposo de Oya
Elos aconselharam fazer Ebo
Ele ouviu e o fiz
Agora, Sango apareceu
Ele é o esposo de Oya
Ele brilhará e calará a boca das pessoas malvadas
O verso citado
acima deixa claro que Sango e Oya tiveram uma relação de complemento, ambos se
tornaram muito fortes, um por causa do outro, ela o acompanhou até o fim de seu
reinado que se estima foram uns sete anos. Já nesse tempo Sango tinha dois
fortes generais que contavam com o apoio do Oyo mesi, um era chamado Timi
agbale ofaina, muito respeitado por usar flechas de fogo nas batalhas, o outro
era Gbonka. Sango sabia que seu poder político estava sendo diminuído já que
nas últimas campanhas militares na cidade de Owu os generais desobedeceram a
ele, por conselho de Oya enviou os dois generais a governar cidades da
fronteira do império. Timi foi para Ede, mais Gbonka não obedeceu e ficou em
Oyo. Gbonka articulou pelas costas de Sango um golpe de estado e derrotou ele.
Isso foi possível com o apoio do povo que já vinha a anos inconformado com o
abuso de poder que Sango exercia.
Sango se sentiu
traído e humilhado, e deixou a cidade de Oyo acompanhado por sua mulher Oya e
uns poucos seguidores ainda fieis. Nesse exato momento é aonde começa o mito
envolto a este Orisa. Ao certo ninguém pode saber o que de fato aconteceu, mas
tentarei oferecer uma posição neutra para entender o contexto do ocorrido.
A versão dentro
do culto é que ele se torna um Orisa indo para Orun em um momento dramático,
porém espiritual e transcendental, ele teria desaparecido deixando Edun Ara e
fogo no lugar, que atualmente é o principal santuário dele, onde somente o
Mogba (Principal sacerdote de Sango) pode ter acesso. Esta localidade é chamada
de Koso.
Por outro lado,
quando o povo de Oyo não recebeu notícias de Sango, o rumor de que ele teria se
enforcado em uma arvore de Ayan, outros dizem em um pé de Obi, outros em um
Odan, mais o certo é que até hoje muitos acreditam que ele se enforcou, criando
assim um mito que fala da transcendência de aquele homem forte é corajoso que
um dia foi. Em contrapartida os seguidores de seu culto tentam matar essa
versão dizendo, Oba ko só ara´ye “O rei não se enforcou, seu corpo vive”.
Não há a menor
dúvida que ele foi eternizado pelos que o queriam e pelos que não o queriam, mas
ele hoje é um rei divino que marcou uma época histórica para seu povo, com
grandeza, liderança, astúcia, dono de um bom gosto adiantado para sua época,
justo com seus fiéis, e violento com seus inimigos, homem apaixonado por sua
mulher, que sua majestade segue intacta até os dias de hoje. Ele certamente é
um Orisa de uma cabeça fora do comum que veio para mudar o mundo.
Ifá diz assim
em Okanran meji:
Aayan nii roso penpe
Alantakun nii gbaja odoodo
A difa fun Sango
Ti yoo joba laye
Ti yoo dorisa lalade Orun
Ebo ni won ni ko se
O gbebo o rubo
Sango wa joba laye
O si dorisa lorun
Gbogbo isowo Ope
E wa ba ni bayo
E waa wore o
Tradução:
A barata é quem se enrola ela mesma na sua roupa
É a aranha quem se sustenta com sua própria corda
Eles consultaram Ifá para Sango
Que se converteria num rei absoluto na terra
E seria um grande Orisa no Orun
Eles aconselharam fazer ebo
Ele ouviu e o fez
Por isso, Sango veio como o rei do mundo
Sendo um Orisa no Orun
Todos os seguidores de Ope (Ifa)
Venham a rodear-se de alegria
Venham a rodear-se de benção
“Kini Arira fi sete?
Igba ota arira fi sete igba ota”
O que usou Arira para vencer inimigos?
Duzentos pedras Arira venceu seus inimigos com
duzentos pedras
Que Sango Olukoso nos bendiga a todos
Akogun Ifáṣọlá Ajobi Àgboọlà
BIBLIOGRAFIA
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Ayò Salamy
*Mitologia dos Orixás Africanos 1
*Ogum – Dor e Júbilo (nos rituais de morte)
SIKIRU SALAMI
*Dicionário Yorùbá (Nagô) Português
Eduardo Fonseca Júnior
*A Enxada e a Lança
Alberto da Costa e Silva
“Não me pergunte o que Ifá está fazendo por você sem que você saiba me dizer, o que você está fazendo pelo Ifá!”
Olúwo Ifábaíyin Awolola Agboola
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