Autor: Olúwo Ifagbaiyin Agboola.
No ano de 1981 comecei a viajar divulgando a religião dos
òrìsà, durante esse período tive a oportunidade de conhecer alguns países, e
grande parte do território nacional brasileiro, nessas viagens conheci várias
casas de òrìsà.
Observei situações
que me deixaram em algumas ocasiões tristes e em outras em uma posição bastante
desconfortável.
Testemunhei equívocos
nas casas de òrìsà que nem sempre são frutos da falta de informação, muitas
vezes a vaidade e a pretensão são as grandes responsáveis por esses erros.
Não temos a pretensão de apresentar esse trabalho como sendo
a única e exclusiva verdade sobre o assunto, vamos pautar a escrita pela lógica
e o respeito à herança religiosa dos yorùbás em nosso país.
A casa de òrìsà normalmente é uma propriedade fruto do
trabalho de pessoas que empregam o seu ganho para criar um espaço para o òrìsà,
sendo assim a lógica indica que o proprietário é a divindade e não o homem.
Vamos explicar essa situação com exemplos do que acontece no
dia a dia das casas de òrìsà:
1- Se o
sacerdote tem uma filha que vai se casar e ele decidir convidar o jovem casal
para que habitem um dos espaços na área da casa de òrìsà é evidente que esse
convite só pode ser formulado depois de uma consulta com resposta positiva dos
òrìsàs.
A mesma posição deve ser mantida para qualquer indivíduo que
possa vir a ser iniciado ou residir na área das divindades, tudo que possa
influenciar no andamento do Egbe deve ser submetido à apreciação do proprietário
do espaço, o òrìsà.
2- Outro exemplo
que podemos citar é a pretensão de uma ampliação ou alteração na construção,
sem a consulta ao òrìsà, isso seria impossível, embora nós já tenhamos
presenciado inúmeras situações que o sacerdote toma as decisões sem ouvir a
divindade.
3- É muito comum
no Brasil após a morte do sacerdote titular de um terreiro que haja uma disputa
entre os herdeiros consanguíneos e os herdeiros ligados a religião.
Nesse aspecto gostaríamos de deixar bem claro que a religião
dos òrìsà é uma forma de manter acesa a chama ancestral, sendo assim, sempre,
sem exceção quando houver duas pessoas com o mesmo nível de informação e cargo
religioso em litigio para ocupar uma função, a tendência natural é que aquele
que tem grau de parentesco seja escolhido em uma orientação espiritual e não
aquele que é um herdeiro exclusivamente religioso.
4- O espaço
chamado casa de òrìsà por uma questão obvia destina o seu melhor aposento para
o òrìsà patrono daquela instituição, ou para um grupo de òrìsà cultuados
naquele local.
Se a divindade é a proprietária é natural que o melhor
espaço da propriedade seja destinado a ela, fato esse confirmado no dia a dia
das casas de religião onde quando visitadas, o visitante primeiro saúda o òrìsà
para depois saudar o sacerdote.
Se fosse o inverso o homem seria, mais importante que o seu
ancestral e a palavra religião não teria sentido, já que na tentativa de nos
religarmos ao divino nos submetemos a uma hierarquia bastante clara onde o
òrìsà está em primeiro lugar.
5- A questão da
propriedade e da sua titularidade das casas de òrìsà habita os tribunais há
muito tempo, embora o ideal fosse que pessoas religiosas que se dizem
sacerdotes não precisassem recorrer a esse tipo de debate. Seria de bom tom que
o religioso seguisse e respeitasse a decisão dos òrìsàs diante de qualquer tipo
de litigio.
As controvérsias não acontecem somente nas questões da
titularidade e da propriedade em si, é comum presenciarmos a disputa da
titularidade da função religiosa independente da propriedade.
Presenciamos inúmeras vezes situações que criam uma enorme
confusão diante da sociedade, um exemplo é o duplo sacerdócio em uma mesma
propriedade. Casais iniciados para a mesma função desempenhando em um mesmo
espaço trabalhos paralelo. Quando a regra é simples o mais antigo e mais
capacitado sempre deveria ser o titular.
6- Existe também
uma grande polemica quando o herdeiro escolhido de uma casa de òrìsà não está
capacitado, embora seja bem fácil de compreender a função do responsável
interino, que ocupa a titularidade com o tempo pré-estabelecido para a
capacitação do real herdeiro.
Se não fosse só a questão financeira e jurídica o número de
situações presenciadas por nós não nos causaria tantas surpresas. Porém um
agravante é bastante comum, supostos òrìsàs ou divindades em visita aos seus
descendentes que muitas vezes terminam advogando em causas de seus simpatizados
criando uma imagem que prejudica muito a história de gerações e gerações de
sacerdotes.
A coerência e o respeito assim como a ética, comumente são
deixados para trás por pessoas movidas por ambição e ganância, isso não deveria
acontecer nos meio religioso, mas infelizmente essas situações são bastante
comuns.
Esses fatos não
aconteceriam ou seriam facilmente administrados se a formação dos líderes
religiosos fosse mais exigida, enquanto isso não acontece os tribunais
substituem os òrìsàs nas decisões.
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