Dor nas costas
e a pomba gira do Crivella
Autor: Olúwo Ifagbaiyin Agboola
Nos últimos seis anos com o projeto Ifá é para todos
viajamos mais de trezentos e vinte três mil quilômetros, essas viagens de
automóvel divulgando Ifá me obrigam a dirigir por muitas horas, a consequência
disso é uma dor nas costas que terminou sendo uma companheira desagradável em
meus deslocamentos.
Por essa razão, necessitei consultar um médico ortopedista,
fiquei surpreso com o valor cobrado por esses profissionais, em média uma
consulta pode chegar a quatrocentos reais.
Diante dessa situação imaginei qual seria a reação das
pessoas se um Bàbáláwo cobrasse esse valor por uma consulta á Ifá.
Comparando a formação nas duas atividades o tempo de estudos
o Bàbáláwo deve estudar muito mais em bora de um modo geral as exigências sejam
bem parecidas.
Para formar um bom
médico e um bom sacerdote de Òrúnmìlá praticamente tem o mesmo custo
financeiro.
Um bom médico estuda em bons livros que muitas vezes
necessitam ser traduzido da mesma maneira que um estudante de Ifá fora da
Nigéria.
As exigências são praticamente as mesmas mas a sociedade
trata essas duas pessoas de forma diferente.
Porque?
É evidente que é preconceito!
Lendo um texto do Dr. Hédio Silva entendi o aspectos
jurídicos dessa questão e fui motivado a fazer essa abordagem.
Diz em seu texto o brilhante advogado:
Organização das
Nações Unidas (ONU) prevê que toda confissão religiosa tem o direito de
selecionar, eleger e nomear seus sacerdotes de acordo com seus dogmas e
tradições.
Na Constituição Federal encontramos duas regras
importantíssimas:
1. é livre a organização religiosa, a liturgia, o culto e a
crença;
2. é livre o exercício de qualquer ofício, trabalho ou
profissão, havendo casos em que a lei exige certos requisitos.
Qual a diferença entre ofício, trabalho e profissão?
• ofício é uma ocupação permanente (intelectual ou manual)
que geralmente não exige formação técnica ou escolaridade.
O conhecimento em que se baseia o ofício pode ser
específico de um determinado grupo ou segmento.
Por vezes ele resulta de um dom, um pendor natural; por isso
a lei não estabelece nenhuma exigência para o seu exercício;
• profissão indica uma atividade ou ocupação técnica,
exigindo, em muitos casos, escolaridade, treinamento e habilitação técnica;
• trabalho é todo esforço físico ou mental (intelectual)
remunerado, dirigido a uma finalidade econômica.
Vemos assim que sacerdócio não é profissão, tampouco
trabalho.
Não é profissão porque em muitos casos tem muito mais a ver
com dons naturais do que com técnicas.
Não é trabalho primeiro porque não se dirige a uma
finalidade econômica – e sim espiritual; segundo porque não pode ser
remunerado: sacerdote não recebe salário, não é empregado.
Mas pode ter sua
subsistência mantida pela organização religiosa.
Há vários casos em que pastores e padres foram ao Poder
Judiciário reivindicar vínculo de emprego com igrejas: em todos eles os
tribunais concluíram que o ministério religioso é ofício e não trabalho ou
profissão.
Isto quer dizer que a organização religiosa pode e deve
garantir o sustento do sacerdote/sacerdotisa – o que é diferente de
remuneração, de salário.
Há um outro aspecto que merece atenção: para tornar-se
Advogado, além de concluir a faculdade de Direito, o indivíduo precisa ser
aprovado em um exame organizado pela OAB – Ordem dos Advogados do Brasil.
Seria possível a exigência de um exame de seleção para que
alguém seja considerado Sacerdote ou Sacerdotisa de qualquer religião?
A resposta é não, definitivamente não! Cada Religião tem o
direito de decidir sobre a escolha, preparação e indicação dos seus sacerdotes.
A Constituição brasileira proíbe o Estado de impor qualquer exigência,
inclusive escolaridade, para que alguém seja considerado Ministro Religioso.
O Brasil não possui religião oficial (estado laico), de modo
que todas as religiões são iguais perante a lei. Do ponto de vista jurídico, um
Rabino é ministro religioso tanto quanto um Sheik, uma Ìyálóòrìşà, um Dirigente
Umbandista, um Pastor ou um Padre.
Como fazer, então, para que alguém seja considerado
legalmente Ministro Religioso (termo utilizado pela legislação)?
A resposta está na “Declaração para a Eliminação de Todas as
Formas de Intolerância e de Discriminação Baseada em Religião ou Crença”,
adotada pela ONU em 1982.
O art. 6º desta norma internacional determina que toda
Religião tem o direito de “treinar, apontar, eleger ou designar por sucessão
líderes apropriados de acordo com as exigências e padrões de cada religião ou
crença”.
Na prática isto significa que:
• O estatuto da organização religiosa deve prever que aquela
comunidade, além dos dirigentes civis (Presidente, Tesoureiro, etc.) possui
um(a) dirigente espiritual, que a lei chama de autoridade ou ministro
religioso;
• A indicação, nomeação ou eleição do(a) Ministro(a)
Religioso(a) deve constar em ata, do mesmo modo como se faz com os dirigentes
civis.
Não importa a forma pela qual cada comunidade indica o(a)
Ministro(a) Religioso(a). O importante é que seja feita uma ata da
nomeação/indicação e posse.
Uma vez que estatuto e ata estejam registrados em cartório,
aquele(a) dirigente espiritual passa a ser considerado legalmente Ministro
Religioso. E mais: nenhuma pessoa, seja funcionário público, Juiz, Prefeito,
Governador ou Presidente da República poderá dizer que aquela pessoa não é um
Ministro(a) Religioso(a). Caso isso acontecesse, estaríamos diante de um crime,
a discriminação religiosa, com pena de prisão que varia de 3 a 5 anos.
Esta é mais uma razão para que os Sacerdotes e Sacerdotisas
se preocupem com a parte legal, a regularização dos templos e do próprio
sacerdócio.
A reflexão que deixo para os(as) leitores(as) é a seguinte:
aprendi logo cedo, nas Minas Gerais, que quanto maior a liberdade maior deve
ser a responsabilidade. Como é grande a liberdade de crença em nosso país,
igualmente grande deve ser a seriedade, integridade e responsabilidade dos
nosso sacerdotes.
Imaginem então esse fato que obriga nossos sacerdotes a
dizerem que não são profissionais, implicando muitas vezes em situações vexatórias
considerando a não justificativa de renda em uma sociedade capitalista entre
outras que situações que denigrem a imagem de nossos sacerdotes.
Nessa hipótese Bàbáláwos e Bàbálóòrìşà quando abordados na
rua por uma autoridade Policial, devem mentir ou omitir a sua ocupação?
Como solução ao problema os evangélicos estão tentando
aprovar a lei que reconhece a profissão de teólogo, e mais uma vez saíram na
nossa frente.
O conhecido marginal pastor Marcelo Crivella foi o autor de
um desses projetos,
Embora já existisse outros projetos com a mesma proposta.
Como podemos ver a á regulamentação da profissão de teólogo
é uma das peças do quebra cabeças constituído por um conjunto amplo de ações
contra o povo de òrìşà.
As invasões, as casas de òrìşà no estado do Rio de Janeiro,
fazem parte de um complexo plano contra nós.
Um emaranhado de leis
aprovadas na calada da noite incluindo os ajustes que foram feitos no passado
ao estatuto da criança e da juventude com a finalidade de afastar as crianças
das casas de òrìşà, nos deixa claro o projeto de poder dos evangélicos.
Imaginem em um futuro não muito distante os pastores sendo
considerados profissionais religiosos e os Bàbáláwos e Bàbálóòrìşà sendo
casados como foras da lei.
Isso é só o começo!
Ainda vamos ter muita dor nas costas e muita dor de cabeça.
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